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sábado, 25 de abril de 2020

Não busquemos alívio na ideia de que só morrem velhos


Vivemos tempos difíceis, de ansiedade e medo, perante a ameaça do novo coronavírus. Houve que fazer mudanças em tudo aquilo a que estávamos habituados, desde a missa de domingo à ida ao café, ou até uma simples visita a familiares. Tudo mudou. Há falta de transportes públicos, fazem-se filas à porta das lojas e supermercados que ainda se mantêm abertos, afastamo-nos uns dos outros respeitando a medida de distanciamento social, saídas apenas para o estritamente necessário. Estamos confinados em nossas casas, agarrados ao telemóvel, computador ou tablet para comunicarmos com os amigos e seguirmos as informações sobre o número de infetados, mortos e recuperados da Covid-19. A televisão faz companhia aos idosos que vivem sós, com os quais parece que não se importa, pois vai atirando dados e estatísticas com a pretensão de nos aliviar o medo mas aumentando o medo e ansiedade de quem tem a idade já um pouco avançada nos anos.
Ah, isto só morrem velhos, ouvimos dizer amiúde. Pois bem, os velhos são pessoas, são os nossos pais, os avós, os tios, os vizinhos. A idade não tira identidade a ninguém. Aquele velho de 80 anos que faleceu com o novo coronavírus é da mesma idade do nosso avô, do nosso pai, do vizinho que nos poda a vinha, da vizinha que nos dá couves ou um raminho de salsa, dos nossos padrinhos, dos nossos tios. É uma pessoa. Nem a idade nem a doença lhe retiram a dignidade de ser alguém, do direito à existência e preservação da vida como a qualquer um de nós.
É triste que busquemos alívio na ideia de que só morrem velhos, como se eles fossem descartáveis. Não são, uma sociedade sem velhos está incompleta, mutilada. As crianças precisam de conviver com a velhice, com o carinho da avó e cumplicidade do avô, com a ternura e paciência com que a tratam. Ter avós é ter a sorte de conhecer um mundo diferente mas gratificante, de ouvir histórias, de aprender cantigas, ditados, orações, lengalengas.
Ter avós é ter a sua primeira enciclopédia pessoal, é sentir o coração encher-se de ternura com os mimos que deles se recebe, nem que seja a oferta de um simples chocolate, uma peça de fruta ou um carregamento do telemóvel.
Cuidemos dos nossos avós, de todos os avós, cumprindo as medidas impostas ou aconselhadas pelos nossos governantes, evitando ser contagiados ou contagiar alguém.
Por nós, por todos. Porque todos importam. E não, não são só os velhos que morrem nem vai ficar tudo bem, mas esperamos que fique o melhor possível.

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