Certo dia um rapaz foi sozinho ao monte e encontrou lá uma rapariga muito bonita, que lhe disse que era uma cobra moura e lhe pediu que a desencantasse, que ela lhe daria muitas riquezas. Ele concordou e ela disse-lhe que fosse àquele sítio durante três dias seguidos, à mesma hora, e que ela lhe apareceria em forma de cobra; cada dia uma cobra maior e ao terceiro dia ele teria de lhe fazer sangue, mas que não tivesse medo que ela não lhe faria qualquer mal.
No dia seguinte o rapaz dirigiu-se ao mesmo sítio. Apareceu-lhe então uma cobra grande, de uns três metros, que se aproximou dele e se lhe enrolou à volta do corpo. Lembrando-se do que a moura lhe dissera, o rapaz controlou o medo e não fugiu. A cobra foi embora.
No segundo dia passou-se o mesmo, mas a cobra teria já uns cinco a seis metros. A custo o rapaz controlou o medo que sentia, mas conseguiu vencê-lo e a cobra foi embora.
Mas no terceiro dia, estando no mesmo sítio à espera, começou a ouvir um grande barulho, como do arrastar de pinheiros. Era uma cobra com dez metros de comprimento e o diâmetro de um tronco de árvore, que ali vinha. Enorme e com uma espécie de concha na cabeça (talvez uma cobra-capelo?) aproximou-se dele. O rapaz tentou controlar o medo mas começou a assustar-se quando a cobra encostou a cabeça à sua. Entrou em pânico e fugiu.
A cobra moura ao vê-lo fugir disse, com amargura: “ah, desgraçada, que me dobraste a fada…” Teria de estar encantada o dobro do tempo que já estivera, até poder tentar de novo encontrar um rapaz corajoso que lhe quebrasse o encanto (ou a fada).
A Moura desencantada
Outra lenda relata o caso em que uma Cobra-Moura foi desencantada com sucesso. O rapaz que o tentava, ao ver no terceiro dia aquela espécie de cobra-monstro, não esmoreceu, porque tinha na mente as palavras da rapariga: Vais assustar-te comigo, mas não te farei mal algum. Acreditou nela e, mesmo quando aquele bicho enorme, semelhante a um tronco de pinheiro com dez metros de comprimento e uma concha na cabeça, se aproximou do seu rosto até quase lhe tocar, ele não teve medo. Picou-a e o sangue escorreu.
Nesse mesmo instante a cobra transformou-se na rapariga que ele conhecera, a única forma que daí em diante teria. Ela agradeceu muito ao rapaz e deu-lhe uma panela, dizendo-lhe que só a destapasse em casa.
O rapaz aceitou a panela por educação, pois era uma panela velha, e despediu-se da rapariga. Foram os dois embora dali, cada um para o seu lado.
Quando o rapaz achou que estava longe e a moça não o via, destapou a panela e viu que estava cheia de carvões em brasa. Despejou o conteúdo na beira do caminho e, entre desiludido e divertido, levou a panela para casa, pois ainda servia para cozinhar.
Ao chegar a casa, destapou a panela para a lavar e viu, com espanto, que os restos de cinza do carvão se tinham transformado em ouro. Arrependido, voltou atrás, ao sítio onde tinha despejado as brasas, mas já lá não havia nada. Já a Moura as tinha recolhido todas.
(Estas lendas foram-me contadas por minha avó, falecida em 2014 com 95 anos.)
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